Tuesday, August 29, 2006

O SUMIDO

Crônica de Luiz Fernando Veríssimo publicado na Zero Hora em 18/10/2004
Do baú. Me disseram Você anda sumido e me dei conta que era verdade. Eu também, fazia tempo que não me via. O que teria acontecido comigo? Não me encontrava nos lugares em que costuma ir. Perguntava por mim e as pessoas diziam é verdade, você anda sumido.E que fim levou você? Eu não tinha a menor idéia que fim tinha me levado.A última vez que me vira fora, deixa ver...Eu não me lembrava!
Eu teria morrido? Impossível, na última vez em que me vira eu estava bem, não tinha que eu soubesse, nenhum problema grave de saúde. E, mesmo, eu teria visto o convite para meu enterro no jornal. O nome fatalmente me chamaria atenção.
Eu podia ter mudado de cidade. Era isso. Podia ter ido para outro lugar naquele momento. Mas por que iria embora assim, sem dizer nada para ninguém, sem me despedir nem de mim? Sempre fomos tão ligados.
No outro dia fui a um lugar que eu costumava freqüentar muito e perguntei se tinham me visto. Não era gente conhecida, precisei me descrever. Não foi difícil porque me usei como modelo. Eu sou um cara, assim como eu. Mesma altura, tudo Não tinham me visto. Que coisa. Pensei: como é que alguém pode simplesmente desaparecer desse jeito?
Foi então que comecei, confesso, a pensar nas vantagens de estar sumido. Não me encontrar em lugar algum me dava uma espécie de liberdade. Podia fazer o que bem entendesse sem o risco de dar como e eu dizer Você hein?.Mudei por completo de comportamento. Me tornei - outro! Que maravilha. Agora, mesmo que me encontrasse, eu não me reconheceria.
Comecei a fazer coisas que até eu duvidaria, se fosse eu. O que mais gostava de ouvir das pessoas espantadas com a minha mudança era: Nem parece você.Claro que não parecia eu. Eu não era eu. Eu era outro!
Passei a me exceder, embriagado pela minha nova liberdade. A verdade é que estar longe dos meus olhos me deixou fora de mim. Ou fora do outro . E um dia ouvi uma mulher indignada com o meu assédio gritar. Você não se enxerga, não? E então eu tive a revelação.
Claro, era isso. Eu não estava sumido. Eu simplesmente não me enxergava. Como podia me encontrar nos lugares onde me procurava se não me enxergava? Todo aquele tempo eu estivera lá, presente, embaixo, por assim dizer do meu nariz, e não me vira.
Por um lado, fiquei aliviado. Eu estava vivo e bem, não precisava me preocupar. Por outro lado, foi uma decepção. Conclui que não tem jeito, estamos sempre, irremediavelmente, conosco, mesmo quando pensamos ter nos livrado de nós.
A gente não desaparece. A gente às só não se enxerga.

Sunday, August 27, 2006

UM CAFÉ PARA XANTIPA

UM CAFÉ PARA XANTIPA
Os homens livres nascidos em Atenas podiam exercer a plenitude da cidadania. Na assembléia (eklesia) decidiam os destinos da pólis, espraiados na praça pública (agora) praticavam a retórica, julgavam, absolviam, condenavam, anistiavam, enfim: praticavam a justiça e a sabedoria. Para os gregos, a justiça e a sabedoria é coisa somente de homens!
O universo masculino grego não se restringia, apenas, à retórica dos discursos, ao livre acesso ao espaço público e as votações nas assembléias. Infinitos eram os seus espaços, seus momentos de prazer: de boa mesa, de boa cama, de belos corpos, da fartura, do sexo entre os iguais. O espaço público na pólis é o espaço dos homens.
Entre os iguais está Sócrates, o filósofo, o mais sábio dos homens, o líder entre os jovens, o destemido crítico. Sócrates como se sabe, não tinha um belo corpo, mas entre os seus escolhidos estava Alcebíades, belo, extravagante, disputado, uma estátua viva zombando da beleza de Zeus. Sócrates e Alcebíades e os outros homens livres participavam do espaço público, dos prazeres do diálogo, da boa mesa e da boa cama.
O giniceu, o aposento das mulheres, é o espaço privado. Lá estava Xantipa, mulher de Sócrates. O historiador Xenofonte, em breve relato, descreveu-a como o estereotipo da ranzinza, da indócil, da megera de temperamento insuportável. No giniceu estão confinadas as mulheres de Atenas que vivem para os seus maridos e que não podem participar das assembléias, dos banquetes e dos jogos olímpicos.
Aos homens o espaço interno do oikos, a publicidade da vida; às mulheres o espaço interno, a privacidade da vida, a reclusão.
PENSARE

PLATAO, ARISTÓTELES

Saturday, August 26, 2006

1968

IDILICA ESTUDANTIL - Alex Polari

Idílica Estudantil
Alex Polari
Nossa geração teve pouco tempo
começou pelo fim
mas foi bela a nossa procura
ah! moça, como foi bela a nossa procura
mesmo com tanta ilusão perdida
quebrada,
mesmo com tanto caco de sonh
o
onde até hoje a gente se corta.

Friday, August 25, 2006

Saturday, August 19, 2006

O RETORNO DA FILOSOFIA

Ivone Bengochea, professora de Filosofia.
No dia 11 de agosto último, o Ministério da Educação homologou obrigatoriedade do ensino de Filosofia e Sociologia. Assim, as autoridades, mesmo que tardiamente, ouviram o apelo da sociedade na luta pelo retorno das disciplinas banidas das escolas pelo obscurantismo predominante com a instauração do golpe militar de 1964 e a visão demasiado pragmática dos legisladores de plantão. Algumas instituições educacionais, minoritariamente, mas com esforço e perseverança de seus professores e alunos resistiram ao massacre intelectual da época e mantiveram as disciplinas em suas bases curriculares.
A disciplina de Filosofia, por exemplo, voltou gradativamente às escolas de maneira optativa, na década de 80. Assim, renovaram-se as esperanças dos professores e das entidades associativas pela inclusão obrigatória do ensino de Filosofia dentro da nova legislação. Entretanto, a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, depois de oito anos de discussão no Congresso Nacional, foi aprovada em 1996. Para decepção de todos não contemplou a obrigatoriedade do ensino de Filosofia e Sociologia. Apenas fez a recomendação das disciplinas como indicativas através da complementaridade dos Temas Transversais e dos Parâmetros Curriculares e não garantiu o desempenho dos conteúdos.
As conseqüências negativas da não-obrigatoriedade do ensino de Filosofia e Sociologia nos currículos das escolas ensino médio do país, deixou marcas indeléveis na educação e na formação cultural da nossa juventude, participantes de uma crise política, social e ideológica, onde vislumbram apenas o individualismo, a competitividade, a ausência de idéias solidárias, o consumismo, o supérfluo predominando sobre o necessário.
A batalha pelo retorno das disciplinas não termina com a sua inclusão legal, tornando-se imprescindível revitalizar o saber filosófico e sociológico, valorizando os seus profissionais. O ensino de Filosofia e Sociologia necessita além explicitar a sua inclusão, perguntar pelo seu sentido, definir o seu papel e proporcionar a investigação dos referenciais teóricos e metodológicos para que seja possível compreender o que elas têm de específico em relação às demais disciplinas. Espera-se, portanto, que as redes de ensino estadual, municipal e particular invistam em melhorias, para que em curto prazo, as lacunas ocasionadas pela ausência destes componentes curriculares sejam preenchidas dignamente.





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Saturday, August 12, 2006

DIÁLOGOS

«Muito aprendeu o homem.
Dos Celestiais muito nomeou,
Desde que somos um Diálogo
E podemos ouvir uns dos outros»
Hölderlin

Friday, August 11, 2006

HISTÓRICO DO PENSARE


FILOSOFIA E O APELO DE EPICURO (341-270 ªC)
"Nunca se protele o filosofar quando se é jovem, nem se canse de fazê-lo quando se é velho, pois que ninguém é jamais pouco maduro nem demasiado maduro para se conquistar a saúde da alma"
PENSARE
OBJETIVOS:
PROMOVER ESTUDOS, PESQUISAS E DEBATES SOBRE FILOSOFIA, CULTURA E HUMANIDADE
PENSARE
Teve sua origem no GERF, Grupo Estudos e Reflexão sobre o Ensino de Filosofia, criado em 1993 por professores de Filosofia com o objetivo de debater a problemática do ensino de Filosofia nas escolas de ensino médio. Intercâmbio com outras entidades afins
HISTÓRICO
1993 – formação do grupo, solicitação de um espaço na SE
1993/1994 Reuniões semanais – Pesquisa s/ situação das escolas com Filosofia nos currículos, estudo dos programas, análise dos livros didáticos
16.08.1994 – Encontro Estadual de Professores de Filosofia na SE .
Set, out, nov 94 – Encontros Regionais com Des da grande Porto e Alegre e Des de Pelotas e Rio Grande.
1995 – Não integra mais a equipe da SE
PARTICIPAÇÃO EM EVENTOS
Mesa Redonda sobre o Ensino de Filosofia na UFSM
Seminários internacional em Artigas –Uruguai
52ª, 53ª,54ª Reunião da SBPC: Brasília, Salvador, Goiânia.
A Partir de 2000 integra-se ao PENSARE em parceria com CEFA
ENSINO DE FILOSOFIA
Mesmo sendo um dos mais antigos campos do saber humano,transita nas escolas sem a desenvoltura das demais disciplinas do currículo.
O PAPEL DA FILOSOFIA NAS ESCOLAS

LACUNAS E PERMANÊNCIAS NA LEGISLAÇÃO
BRASILEIRA, OSCILANDO ENTRE UMA DISCIPLINA OBRIGATÓRIA E, NA MAIORIA DAS VEZES OPTATIVA.
ENSINO DE FILOSOFIA NAS ESCOLAS

GLORIFICAÇÃO E RETÓRICA NOS DISCURSOS OFICIAS
COMPONENTE INDISPENSÁVEL PARA A CONSTRUÇÃO DA CIDADANIA



FILOSOFIA NAS ESCOLAS
ESCOLA PÚBLICA
Investimentos precários
Equivocidade das políticas educacionais
Distante da realidade dos alunos
Alunos massificados por valores consumistas
FILOSOFIA NA ESCOLA
PROFESSORES DA ESCOLA PÚBLICA
DESÂNIMO DIANTE DA CARREIRA
SALÁRIOS DEFASADOS
RAPIDEZ DAS INOVAÇÕES TECNOLÓGICAS

FILOSOFIA NAS ESCOLAS
O lugar da Filosofia nas escolas.
A explicitação do seu papel
Referenciais Teóricos
Metodologia
Encontro dialógico com o pensamento universal

Sunday, August 06, 2006

as barricadas do desejo

Maio 1968, As Barricadas do Desejo

Ivone Fonseca Bengochea

O ano de 1968, é sem dúvida alguma, um marco importante nas transformações dos costumes que caracterizam o século XX. Os acontecimentos que marcaram o mês de maio de 1968 foi a síntese de uma década em que os corações e as mentes de uma geração de jovens estavam plenos de um desejo: mudar o mundo. Havia um consenso de que as coisas precisavam ser mudadas e que as utopias eram realizáveis nas artes, nas escolas, nos sindicatos, nas universidades com a emergência de um mundo novo, mais justo e fraterno.
Um mês de manifestações estudantis em várias partes do mundo, inclusive no Brasil., onde a cultura e a política foram viradas do avesso .Este mês de maio, do final da década de 60, foi o símbolo de uma rebelião para a cultura francesa, uma sociedade que se considerava distante das crises econômicas e institucionais de outros países, a França levou um susto no dia 3 de maio, daquele ano, quando os estudantes da universidade de Naterre realizaram manifestações contra o governo de Charles de Gaulle em Paris. Os cursos das universidades de Sorbone, como também os de Naterre são suspensos e, dois dias depois, os participantes de passeatas punidos com prisão.
Em 13 de maio deste mesmo ano, acontece uma greve geral. Os trabalhadores, também insatisfeitos com a sua situação dão solidariedade aos estudantes e uma manifestação reúne 200 mil pessoas. Em contrapartida vem a represália e os policiais armados têm ordem para atacar as barricadas estudantis.
O movimento estudantil que foi denominado Barricadas do Desejo causou também uma cisão na intelectualidade francesa. Há os que aderem ao movimento como Jean Paul Sartre, Michel Foucault, Giles Deleuze entre outros, surgindo o novo pensamento político que questiona a ordem vigente e se caracteriza por um forte teor revolucionário.
Mas, 1968 não foi apenas um período conturbado para os franceses. A história registra manifestações em Londres, Tóquio, Cidade do México, Praga, Berkeley (nos Estados Unidos), Roma, Amsterdã, Rio de Janeiro e São Paulo. Com reivindicações diferenciadas porque cada país tinha uma situação peculiar no plano político. No Brasil, por exemplo, vive-se em pleno regime militar e especialmente os jovens começam a avaliar porque foram derrotados em 1964 com a quebra da ordem constitucional e a instalação de uma ditadura de direita no país. Há uma efervescência cultural em todos os campos, com manifestações nos festivais da canção, na produção teatral, nos diretórios acadêmicos e nas organizações sindicais e estudantis.
São bastante diferentes as motivações que levaram o descontentamento dos jovens no mundo inteiro a realizarem passeatas , mas havia uma aspiração comum: a de que uma revolução poderia ser feita para emergir um novo homem e uma nova sociedade. Em alguns lugares pedia-se a morte do capitalismo para dar lugar ao socialismo. Em outros, lutava-se contra o socialismo autoritário e burocrata e buscava-se uma nova sociedade sem opressão. Porém, foi a França o grande palco revolucionário. As barricadas, que romanticamente chamou-se As Barricadas do Desejo expressavam-se em grafitis nas ruas de Paris onde se liam frases como estas: A Felicidade é uma idéia nova; O nosso modernismo não passa da modernização da política; Sob o calçamento, a praia; A palavra é um coquetel molotov; Revolução, eu te amo; Imaginação para a poesia ir às ruas; Contra a miséria sexual; A barricada fecha a rua mas abre o caminho; Sejamos realistas, que se peça o impossível.
Recentemente filósofo Michel Onfray, um estudioso do movimento estudantil de maio de 1968, afirmou em entrevista à Folha de São Paulo, no dia 12 de dezembro de 1997:
“Em 1968 ocorreu um rompimento filosófico, uma fratura metafísica em que a autoridade foi julgada e os homens puderam falar livremente, desafiando um meio filosófico reacionário e conservador, que considerava a Europa liberal e cristã a única via.”
Hoje, anos depois, sabemos que a velha sociedade não pereceu, a imaginação, infelizmente, não chegou ao poder no mundo inteiro, a ditadura no Brasil durou 21 anos, a Primavera de Praga passou rápida, a nova sociedade não chegou a nascer, a democracia formal não conseguiu dar as mãos à democracia social.
Porém, maio de 68 abriu uma fissura histórica, foi um acontecimento extraordinário, pois colocou sob suspeita uma sociedade que se considerava ao abrigo das grandes crises, colocou a fé no impossível. E, se não transformou a política e nem a economia a serviço de todos. No entanto, a vitória dos jovens foi no campo comportamental como o feminismo, a liberação sexual, o pacifismo, a ecologia.
Mesmo com muito caminho a percorrer, o importante foi que se deu o primeiro passo. Na França, como no Brasil, não se trata de uma frase de efeito. “O ano de 1968, ainda não terminou.”



Bibliografia:

· CORBIN, Alan. La Barricade. Paris: Laurent, 1978;
· LEFORT, Claude. Maio de 1968, a Brecha. São Paulo: Paz e Terra, 1976;
· MARCUSE, Herbert. O Fim da Utopia. São Paulo: Civilização Brasileira, 1969;
· MATTOS, Olgária. As Barricadas do Desejo. São Paulo: Brasiliense, 1981;ONFRAY, Michel. Folha de São Paulo 12 dezembro de 1967. Página 13

ENSINO DE FILOSOFIA NOS CURRICULOS

REFLEXÕES SOBRE O ENSINO DE FILOSOFIA NOS CURRÍCULOS DAS ESCOLAS

*Ivone Fonseca Bengochea




Na oportunidade em que se discute o veto do presidente da República, Fernando Henrique Cardoso, ao projeto de lei que prevê o retorno obrigatório das disciplinas de Filosofia e Sociologia nos currículos das escolas de nível médio, são pertinentes algumas reflexões sobre os caminhos percorridos pelo ensino de Filosofia no Brasil.
É importante ressaltar que a trajetória da disciplina de Filosofia tem sido acompanhada de antigas contradições que sempre caracterizaram historicamente a sociedade brasileira. Contradições que se evidenciaram através da formação social hierarquizada e do modelo econômico excludente. Acrescida, ainda, do demasiado elitismo, do culto ao bacharel e do distanciamento da realidade circundante.
.A propósito dessas circunstâncias é interessante considerar o que Luiz Fernando Veríssimo escreveu para o Memorial do Rio Grande do Sul :"O ser humano é a medida de todas as coisas. Pelo tamanho do Ser Humano se mede a vastidão do universo, assim como pelo palmo e a braça se começou a medir a terra. todo o conhecimento do mundo se faz de uma perspectiva humana, todo o julgamento do mundo se faz de uma perspectiva humana, todo o julgamento do mundo se faz por um parâmetro humano".
O ensino de Filosofia aportou em nosso país com os religiosos da Companhia de Jesus, em 1549, sendo ministrado dentro do ideário da Contra-Reforma, tendendo para o dogmatismo e com uma perspectiva meramente escolástica, sem levar em conta as contribuições teóricas da modernidade européia com Descartes, Bacon, Galileu entre outros. Constituía-se, assim, num projeto de educação para os setores da elite dirigente, com conteúdo livresco e servindo de deleite ao " colono branco, rico e católico".
Após a expulsão dos Jesuítas, por ordem do Marquês de Pombal, no século XVII, não aconteceram mudanças estruturais no ensino de Filosofia, já que permaneceu ignorando os valores nacionais e reproduzindo as concepções aristotélico-tomistas. E, somente com a criação dos cursos jurídicos no Brasil, no século XIX é que a Filosofia tornou-se uma disciplina propedêutica, obrigatória no ensino secundário.
Apesar do esforço de se libertar dos pressupostos religiosos, os conteúdos filosóficos permaneceram intactos reproduzindo o pensamento europeu, primando pela seletividade, com a maioria dos brasileiros excluídos dos benefícios da educação, priorizando a retórica e enciclopedismo, além de ignorar completamente as questões locais
Até o início do século XX, várias legislações no campo da educação foram editadas. Nenhuma delas, porém, aproximou o ensino de Filosofia da realidade brasileira, apesar das reivindicações e do empenho de muitos professores e intelectuais, engajados nos movimentos reivindicatórios.
Em 1915, quando da elaboração da nova reforma educacional, a Filosofia foi colocada como disciplina facultativa Inconformados com essas decisões, os educadores integrantes do movimento , que se denominou Escola Nova, liderados pelo professor Francisco Campos, empreenderam esforços para inserir no documento legal a inclusão obrigatória da Filosofia.
Os escolanovistas .estavam imbuídos de uma tendência renovadora na educação. Entendiam, pois, que diante da crise econômica do modelo agro-exportador brasileiro e a emergência do sistema industrial necessitava-se aprimorar a escolarização para os setores urbanos. A persistência de Francisco Campos conseguiu reverter o quadro, favorecendo a inclusão de conteúdos filosóficos , conseguindo introduzir lógica, sociologia e história da Filosofia no currículo escolar.
Uma nova reforma em 1942, tendo a frente Gustavo Capanema dividiu o ensino em ginásio, com quatro anos, enquanto que o colegial, com três, era subdivido em científico e clássico. O clássico previa uma substancial carga-horária de quatro horas semanais de Filosofia. Uma série de portarias foi aos poucos reduzindo as horas-aulas da disciplina e as séries que contemplavam espaços para os conteúdos de filosóficos..
No ano de 1961,um marco importante foi a edição da nossa primeira Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, Lei 4024. O fato negativo, porém, é que a Filosofia constava apenas como uma disciplina complementar, perdendo assim a sua obrigatoriedade. A inclusão dos conteúdos filosóficos foi jogado para as decisões emanadas através dos Conselhos Estaduais de Educação.
O obscurantismo predominante com a instauração do golpe militar de 1964, evidenciou-se na visão demasiado pragmática dos legisladores de plantão. O cerceamento das liberdades políticas e institucionais baniram a Filosofia dos currículos, tornando-a facultativa .Algumas disciplinas das áreas de ciências humanas sofreram também restrições através de cortes em sua carga-horária
. Em 1968, quando o regime tornou-se mais duro, muitos professores foram cassados e presenciou-se freqüentes perseguições à associações estudantis, entre outras tantas arbitrariedades. Através da Lei de Diretrizes e Bases - LDB 5692/72,, imposta verticalmente, o ensino de Filosofia tornou-se facultativo, sendo substuído por componentes doutrinários como Moral e Cívica e OSPB., E com o assessoramento dos técnicos do (MEC-USAID), investiu-se no ensino profissionalizante, seguindo-se os conceitos tecnicistas.
Algumas escolas, minoritariamente, mas com muito esforço e perseverança de seus docentes conseguiram resistir ao massacre intelectual da época de que "pensar é perigoso" e mantiveram à duras penas Filosofia em suas bases curriculares.
O fim da ditadura e a conseqüente redemocratização do país trouxeram novas luzes. A disciplina de Filosofia foi retornando gradativamente às grades curriculares das escolas de maneira optativa. E, assim, renovaram-se as esperanças dos professores e das entidades associativas pela inclusão obrigatória do ensino de Filosofia dentro da LDB nacional .
Mas, a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, depois de oito longos anos de discussão no Congresso Nacional, foi finalmente aprovada em 1996. Para decepção de todos não contemplou a obrigatoriedade do ensino de Filosofia. Apenas faz a recomendação da disciplina como indicativa através da complementariedade dos chamados Temas Transversais e dos Parâmetros Curriculares que não garantem o pleno desempenho da Filosofia, pois são de difícil aplicabilidade em função da estrutura e da burocracia escolar.
Importa deixar claro as conseqüências negativas resultantes da situação de não-obrigatoriedade do ensino de Filosofia nos currículos das escolas ensino médio do país, deixou marcas indeléveis na educação e na formação cultural da nossa juventude, participantes de uma crise política, social e ideológica, onde vislumbram o individualismo, a competitividade, a ausência de idéias solidários, o consumismo, o imediatismo, o supérfluo predominando sobre o necessário.
Imersos na avalanche midiática do discurso lacunar, da competitividade, da ausência de criticidade, das idéias prontas, mas tidas como verdadeiras e imutáveis, a maioria dos jovens brasileiros, infelizmente, não têm acesso ao ensino universitário, estando, portanto, alijados do espaço privilegiado para filosofar, aprender a pensar por si mesmo e exercitar a cidadania.
Urge, portanto, desmistificar a idéia corrente segundo a qual a Filosofia é uma disciplina difícil, complicada, obscura e que nesta sociedade tecnologicamente avançada trata-se de um saber inútil, sem nenhuma relação com as atividades da vida prática. O estigma que paira sobre a Filosofia precisa ser contestado, já que carrega consigo o propósito de desistimular a reflexão crítica sobre as circunstâncias em que se vive, aceitando com passividade a rigidez do senso comum e os preconceitos. Como diz Hegel "a Filosofia, desde o ponto de vista da razão humana, é o mundo ao avesso".
A luta pelo retorno da Filosofia não se restringe à obrigatoriedade nos currículos do ensino médio, um esforço que está sendo empreendido por significativos segmentos da sociedade. Mas, é imprescindível, também, revitalizar o saber filosófico e valorizar os seus profissionais.
O ensino de Filosofia necessita além explicitar a sua inclusão, perguntar pelo seu sentido,definir o seu papel e proporcionar a investigação dos referenciais teóricos e metodológicos para que seja possível compreender o que tem de específico em relação às demais disciplinas.
O espaço da Filosofia é um espaço de busca e de diálogo, como está presentificado na própria origem da palavra Filo, aspiração, amor, e Sofia, sabedoria. Diante dos desafios do nosso tempo, mais do que nunca, é fundamental que se filosofe, que se aspire à sabedoria, no sentido grego da palavra, que se sature a capacidade do " assombro" .
Assombro sim diante dos acontecimentos, das vivências, porque é do assombro que surge a pergunta e com a pergunta o problema e com o problema a intenção de solucioná-lo. Numa seqüência e numa aspiração sempre renovada de conhecimento e sabedoria.
* Publicado na Revista originalmente na Revista VOX XXI.






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